quarta-feira, 24 de dezembro de 2014


 




Leves


Leves me trouxeram até à praia
as espumas brancas das ondas
que sobre as areias se desfizeram
Das águas encapeladas
caiu uma chuva fria que me acordou
e pôs a vogar até à eternidade


(Manuela Reis)




terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Escrivaninha

Sento-me diante da escrivaninha de ébano,
meu mundo de ideias, recordações, gavetas embutidas,
falsos e canetas antigas;
rolos de papel cor de sépia,
desenho e um solitário de rosas amarelas.
Meu mundo de sonho nos espaços de outrora
e incursões de agora.

(Manuela Reis)

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Oscilações

É um burburinho de luz,
um som que passa
ao longe e aqui, sobre as
minhas mãos que escrevem;
a dança das sombras e do
perfume das rosas; a estante
de livros vermelhos encadernados,
os sinos, os quadros a óleo e aguarela;
os retratos, a estatueta de bronze;
o caderno aberto e a caixa de música.

(Manuela Reis)

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Maputo 

Punho de luz
em movimento.
Olhar das gentes
que se cruzam
num bulício.
Sorriso sobre o Índico
hospitaleiro
e cheio de cor.
Ponto de encontro.
Saudade. 

Junho de 2014
(Manuela Reis)

terça-feira, 8 de julho de 2014

Sonho

Sombras dum sonho.
Veredas que o conduzem
ao longo dos caminhos,
olhando as frestas
e o arvoredo
que o acolhem cedo.

(Manuela Reis)

quarta-feira, 2 de julho de 2014


Entardecer em Maputo


Entardecer
E uma mágoa repentina cai lentamente
dentro de mim e alonga-se sem parar
pelas beiras dos muros que anoitecem...
Cai a noite e chega como um estranho
novo dia de semblante inesperado e misterioso...


Manuela Reis
Maputo, maio de 2014

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Entardecer

Sento-me à espera do entardecer
desejando que ele não chegue antes de mim.
Depois, de repente, abrem-se as horas
intermináveis que se alongam sem memória.
Ouço o escuro como se fosse fonte
que então começa a verter água brandamente... 

Manuela Reis
Maputo, maio de 2014 

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Despertei com a luz lisa, clara, límpida.
Aurora.
Caminhei à procura de figos, uvas, maçãs.
Manhã.
Segui com o cão, cajado, tenda,
Dia.
Parei, armei a tenda e deitei-me sob as estrelas,
Noite.

(Manuela Reis)

domingo, 4 de maio de 2014

Mãe, ao partires
e só então
deixei de ser menino
Fecharam-se
as gavetas
da minha infância
e fiquei
a sós comigo

(Manuela Reis)

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Silêncio

Silêncio ressurgido dos interstícios
da terra como toalha branca
caída do tear sobre o meu colo,
Bordado em flor azul
tão azul como os olhos da criança
que vive neste lugar.

(Manuela Reis)

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Jardim da Boavista

Volto ao jardim mágico
da infância
que eu atravessava
no regresso das aulas,
ficando sentada nalgum banco de ferro,
tirando castanhas dum cone de jornal
e balouçando as pernas.
Dou uma volta completa
e lenta entre as camélias,
pisando o chão juncado de folhas
como se fosse a princesa
dos meus antigos contos de fadas.
Olho lá para cima e reconheço
os áceres, os plátanos, os carvalhos
e outras árvores
de que nunca soube o nome.
E de repente,
Como se já não estivesse ali,
num estremecer inesperado,
ouço aquela voz familiar
sempre viva e quente,
perguntando
se eu já tinha chegado.

(Manuela Reis)
in "Antologia de Poesia Contemporânea / Entre o Sono e o Sonho vol. V / Tomo II / Chiado Editora

sexta-feira, 21 de março de 2014

Poema

Meu refúgio, protector e mensageiro,
de todos os segredos que em mim viveram,
trazias contigo o sentido das coisas
e a lembrança de todos os deuses que apareceram.

(Manuela Reis)


segunda-feira, 17 de março de 2014

Acordo-me

Acordo-me sem passado
novíssima de palavras sagradas
e de espaços abertos e luminosos
Estou só mas vejo-me no firmamento
como se fosse outra que não eu
Chove numa chuva de gotas luminosas
duma música inesperada e sem fim

(Manuela Reis)

quarta-feira, 12 de março de 2014

Caminho

Há uma escada em caracol
que subo e desço,
encantada, através dos anos,
conforme as histórias
que vou contando.

(Manuela Reis)

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

O inverno e a primavera

É o inverno que
com cuidado,
guarda em si
a primavera.

Por isso vou
pelos seus caminhos,
à procura das
árvores cheias
de mistério
e que bem perto
guardam o
perfume adivinhado.
O perfume
das flores
aparecidas
na sua hora...


(Manuela Reis)

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Um dia

Um dia serei eu mesma a praia
com os seus infindáveis areais,
com o sargaço, as conchas e as pedras.
E por fim a água azul e os rochedos
Levando para longe, com as gaivotas, os meus medos.

No paredão da praia acerca-se uma caravela.
A aragem passa e eu fico com ela...

 (Manuela Reis)

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Pinceladas

A toalha era de linho
bordado a matiz.
As chávenas de louça branca.

O bule parecia
um pássaro azul
voando dum para o outro
lado na mesa.

Era assim que minha avó
servia o chá perfumado
às netas, debaixo do
caramanchão
cheio de frescura.

(Manuela Reis)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Perspectivas

A fresca aragem da noite
entrando pela janela,
as rosas amarelas numa jarra;
ao lado, a lupa e o caderno aberto
na mesa oval da sala coberta
duma manta de renda, o rumor
de vozes vindas não sei donde.

(Manuela Reis)

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Como conchas

Estende as tuas mãos
como conchas
e deixa emergir
delas o cheiro a
maresia
Estou na praia
mas parto então
para longe muito
longe para portos
desconhecidos
seguindo a voz
misteriosa
que de longe me
chama

(Manuela Reis)