quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Coisas

Nas coisas que vos deixo
espalhadas pela Casa,
fica a minha alma
ligada aos lugares
em que as achei.
Em longas caminhadas,
lá muito longe,
ou perto dos sítios
onde passei e me detive, num mistério.
Na mão com que as toquei
e as escolhi,uma entre
muitas e muitas, senti um apelo.
Era o coração que as nomeava
entre dez, cem ou mil, e havia
algo de íntimo e sagrado
que me deixava em sobressalto.

(Manuela Reis)

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Poema evocado

Suave desliza a gôndola
Cisne ou figura alada
entre nós dois
intersectando brumas
nevoeiros
em direcção às margens
do quadro...
Perplexo antevejo
A assinatura
dum pintor
que ainda
há-de vir
ou se já veio
fê-lo há muito tempo
tanto tempo
que as próprias
cores se apagaram
Misteriosas passam
as luzes que ficaram...

(Manuela Reis)

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

No vidro gelado

No vidro gelado das ruas da cidade
traçam arabescos de bailarina
as palavras
dum pássaro de fogo
que bate as asas
deixando centelhas de lume
e retoma a seguir o seu alto voo 

(Manuela Reis)

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Disco de Phaistos
 
Há um esplendor de Mistério,
de Sagrado, no Disco de Phaistos,
como se de salmo ou hino se tratasse.
 
Há um esplendor de Mistério,
de Sagrado, no Disco de Phaistos
cuja espiral, seguindo a direção da mão
imprime com moldes e carimbos
os símbolos do mar, da terra e do ar,
como o do homem, o peixe, a flor, o machado e a ave.
 
Há um esplendor de Mistério,
de Sagrado, no Disco de Phaistos,
o texto indecifrado.
 
Manuela Reis
 
Creta - "Museu de Herákleion"
 

terça-feira, 18 de setembro de 2012


Pedra rara
 
Cruzei os dedos
à transparência
da água
e entre eles encontrei uma pedra rara 

(Manuela Reis)

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Poço


Quanto mais cavo
no silêncio, mais seixos
surgem na brancura.
Nomes que falam de tudo,
que nomeiam as coisas
mais variadas e ternas.




(Manuela Reis)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Os traços dos teus gestos

E os traços dos teus gestos
atravessaram os espaços,
marcando a curva livre
lançada nas montanhas
e escorrendo pelas pedras.

(Manuela Reis)

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Palavras
        
Há torrentes
de palavras
que brotaram
dos confins
da terra
Outras brotaram
doutros mundos
e de outras eras
Outras ainda
continuam a brotar
dos meus dedos
agora.

(Manuela Reis)

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Noite no rio 

É noite.
Passada a Igreja do Ó,
subo a calçada
mas viro-me e fico a meio,
indiferente ao gélido frio,
tomada do fascínio das luzes
que entre baforadas do nevoeiro,
sob vários ângulos sobem do rio.


(Manuela Reis)

terça-feira, 4 de setembro de 2012


O Silêncio de Delfos

Há um silêncio carregado
de forças ancestrais ampliado
pela música e profecias ditadas por Apolo

Há um silêncio vasto
ampliado pela pedra
recuperada das profundezas da terra

Há um silêncio condensado
que se despenha dos penhascos
e rola até ao vale
de oliveiras ciprestes e pinheiros

Há um silêncio palpável
no chilrear dos pássaros e no fumo
que se eleva e espalha ao longe
na chaminé duma casa da aldeia de Arahova

Há um silêncio vasto e condensado
É o Silêncio de Delfos
Centro do mundo

(Grécia)

Manuela Reis

domingo, 2 de setembro de 2012


Sanségur

Fecho os olhos.
Subo
de novo
Sanségur,
o castelo cátaro.
Estou noutros
tempos
mas esqueci
a minha história.
Os pés escorregam,
doem-me os olhos,
mas tenho de continuar.
Descobrir-te-ei,
oh meu passado,
lá em cima,
em Sanségur,
o castelo cátaro.


(Manuela Reis)